Ouve-se um choro; mais um
Nada anormal, muito comum
Natural, em toda a vida
Da saudade da mãe à juventude perdida
Da dor de crescer, da palavra sentida
Desse choro, desses olhos, dessas lágrimas
Nascem versos, rimas, páginas,
O ‘beabá’, as expressões, as emoções
Neste caderno, desde as letrinhas do cabeçalho
Escritas a lápis e com borrões
Faço dele um diário
Repleto de sonhos e pretensões
E tal qual o enunciado
Enfrento o mesmo questionário
E desenho as opções
Bombeiro, polícia, cantor ou boleiro
Qual garoto não teve esse ideal?
Assim como o choro normal
Não sou o único, nem primeiro
Primeiro, toda a criança quer ser
A chegar na escola, a pegar a fila
A ser escolhida, na nota que tira
Longe disso, nem zero nem dez
Nesse meio termo, um seis talvez
E nesse meio tempo, acaba o recreio
Hora de aprender, não tem revés
E na sala, ao olhar a janela
Queremos passar por ela
Fugir dali, encarar o mundo
E quando bate o sinal
O som da liberdade, sabemos tudo
A aula acabou
Mal dormimos na volta pra casa
E o que era um desenho, o choro manchou
E agora, o empenho
O sonho acordou
E aquele sinal que a escola soava
Até hoje mantenho,
ai como eu sonhava
Na lembrança de um tempo
em que a hora durava
E hoje, em rascunho
Troco lápis por tinta
Borracha, por rabiscos
A criação que não pinta
Em minhas mãos, transformo aquarelas
Sem as cores tão belas de outras eras
Em letras, versos e riscos