quinta-feira, agosto 11, 2016

Aquele moleque

Se liga naquele moleque
Que joga descalço, que curte um rap
Que dribla sambando a turma de beque
Futuro incerto, a vida em xeque

É muita ousadia daquele pivete
Querer ter um dia, o que ele merece
Briga por direitos, mas nunca recebe
O Estado se impõe é na lei cassetete

É desse jeito que querem que ele aprenda
A tal conquista por meritocracia
Se tá pra trás, fica na boa, entenda
Faltou vontade e valentia

Esse garoto é quem produz a renda
De uma história que só lhe feria
Querem sua alma, em promoção, a venda
Sistema hipócrita de covardia

Mas, esse moleque ainda sonha vencer
Não é na escola que vê um caminho
Quer ir pra Europa, jogar na TV
Ser mais uma estrela, a la Ronaldinho

O crime é uma zaga de forte poder
Dribla na habilidade, chapéu e rolinho
É só vitimismo pra se defender
Deu pala, é vala, aperta o gatilho

quarta-feira, agosto 10, 2016

LágRima

Não deve ser à toa que a palavra lágrima
Termina com a palavra rima
Ela expressa uma dor, qualquer lástima

Não deve ser à toa que elas molham, por exemplo, um papel
Seja um lenço para enxugá-las, ou estrofes pra borrá-las
Elas cortam por dentro, escorrem por fora, de forma cruel

Não devem ser à toa que elas têm sabor de sal
Nem que escolheram os olhos pra escorrer
Neles não se escondem o sentimento real

Não deve ser à toa que a lágrima, inclusive por contentamento
Após desaguar, ela acalma, faz a limpeza de dentro pra fora
E depois que o corpo chora, não sobra ferida ou ressentimento.

terça-feira, agosto 09, 2016

Amor também

Amor não é meu tema mais frequente
Pra não dizer que é quase raro
Sou mais de outras questões tão presentes
Das quais eu lamento ver, mas não me calo

Não é que o amor é silêncio em minha vida
Nem que ele seja desimportante
É que floresce mais história doída
Que qualquer romance apaixonante

Esse olhar pro lado mais sofredor
Não deixa o amor em segundo plano
Eu consigo também escrever sobre amor
Eu consigo também rimar: eu te amo!

E esse poema; esse, especificamente
Escrevo porque me causa agonia
Não sou dos românticos, minha gente
Mas, sou inteiro poesia

Sou dos que escreve sobre a rotina
Que afronta olhos acostumados
Minha mente observa e logo combina
A narrativa com versos rimados

Não sou dos cultos, que leem a rodo
Que manjam poetas, obras, citações
Vejo mais poesia na pedra com lodo
Que paisagens sonhadas nos eternos padrões

O que escrevo pode não ser erudito
Nem agradar quem domina essa arte
Mas, são nesses versos que acredito e deposito
A minha contribuição, a minha parte

Às vezes metódico, às vezes despirocado
Às vezes melódico, ou então proseado
Às vezes eufórico, às vezes quadrado
Às vezes retórico, às vezes largado
Às vezes alcoólico, sem ter embebedado

Não planejo o poema no primeiro rabisco
Eu simplesmente começo sem saber onde vai dar
Só assumo de cara um compromisso
A poesia não vai me abandonar

Seja ela qual for
Se for pra falar de amor
Se for essa a inspiração

É sobre amor que vou falar 

segunda-feira, agosto 08, 2016

Você também já foi mulher

Na TV, uma reprise do Roda Viva
Escritor Mia Couto, o entrevistado
Mal liguei, uma frase me cativa
Fulano já foi mulher. Mia Couto disse “eu também”
O contexto? Não sei se falavam do passado
De reencarnação, do além,
Ou se apenas era uma referência
De algum personagem inventado
Ou especificamente de alguém

Eu sei que nessa hora, minha mente voou
Pensei: realmente, todos já fomos uma mulher
Afinal, foi em uma que o embrião se formou
E todo mundo ansioso, o ultrassom revelou
Que sexo que o bebê é

Mas, antes de você estar no colo chorando
Só ela que sentia sua presença pulsando
Todo mundo sabia que você existia
A barriga não parava de aumentar, só crescia
Dia após dia
Mas você ainda não era ninguém
E hoje tá aí se achando o rei de quem?

Tem cara que esquece que já foi uma mulher, sim
Aquele coração batia por dois, o corpo comia por dois
O esforço era feito por dois, era uma trabaiêra sem fim
E ainda mesmo assim
Tem quem acha que a mulher é inferior
Seja pro trabalho, sexo frágil, pro assunto que for

Tanto, mas tanto tempo já passou
E o humano não evoluiu
O preconceito progrediu
Causando ainda mais dor

Quando penso na frase que todos já fomos mulher
Pensei no sangue que nos abasteceu
Que não há no mundo, ser qualquer
Que não foi por obra dela que nasceu

Pensei que contrarie quem quiser
Também use o argumento que puder
Pra tentar se desfazer desse mais importante ser
E se você me convencer, e enfim se desfizer

Saiba que aconteça o que acontecer
Você pode sofrer o que vier
A porta nunca vai bater,
Faça o que fizer
É sempre uma mulher que vai te receber
Seja ela quem for, esteja onde estiver
Você também já foi mulher e ela é parte de você.

quinta-feira, agosto 04, 2016

Os anéis

Ficam os dedos
Vão-se os anéis
Ditado bem apropriado
Fica o povo esfolado
Contando merréis
(ah... escassos merréis)

E os anéis logo vão
Cruzar o mundo, lá pro Japão
Vão juntar mais bilhão, trilhão, quadrilhão
Em moeda, papéis, medalhão

Daqueles de ouro bem bonito
Que o campeão ostenta no peito
Impõe um puta respeito
Comemora no grito

Pra quem compete
É mais que uma medalha
É o topo
É a perfeição, sem falha
Se houve, teve quem errou mais

Sensação de superação
De insuperável
De invencível
De que enfim, foi capaz

De ultrapassar tudo e todos
De ser incrível
Mas, fora o atleta
Que tem sua meta
Do recorde mundial
Ou a meta pra defender
No handebol ou futebol
Os jogos serão sem igual

Não sei se em outra edição
Estava tão bagunçada a nação
O povo é seu próprio rival
Um refém no seu próprio local
Comercial, residencial

A própria casa virou a prisão
Todos trancados no quarto
E na sala, um festão bacanal.