terça-feira, fevereiro 15, 2022

Balas Amargas

Mais um corpo preto assassinado
Mais um corpo preto assassinado
A cada dia, um novo caso
Sem A pra virar acaso
Não é acaso, é descaso

Ou melhor dizendo, tem causa
Só não tem pausa
É um atras do outro
Em comum, a cor do corpo

Dessa vez, um vendedor de balas
Das doces, não das amargas
De por na boca, não nas armas

Balas todos os dias são vendidas
Algumas saboreadas
Outras perdidas
Algumas encontradas
Após perdermos vidas

Uma é 3, duas é cinco,
É um racismo cínico
À luz do dia em Niterói
E o que mais me destrói
É que não acabou
Logo terá outro, sempre preto,
Que, no susto, a arma disparou
 
E não tem idade,
Menino de 9 anos, mesma do meu filho
Também virou alvo do gatilho
Pra ferir o pai, líder na comunidade

Disputas territoriais
Litígio agrário, áreas rurais
Anunciaram-se policiais
Invadiram a casa e sem menos nem mais
Pegaram o moleque embaixo da cama
E mataram na frente dos pais
Nesse caso, vingança, mais que desumana
mas, adivinhe a cor do rapaz
 
Esse, em Pernambuco, Barreiros
De criança, tinha uma charada que eu ouvia
Qual dos estados brasileiros
Com 10 letras e nenhuma repetia
O que de fato o estado brasileiro repete
É o R-A-C-I-S-M-O
Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete

sexta-feira, fevereiro 11, 2022

Empatia Sem Empate

Congolês morto a pauladas
Ao cobrar duas diárias ao patrão
Outro, com 3 balas disparadas
Ao pegar a chave no próprio portão

Um comete crime em palavras
Que o nazismo deve ter seu quinhão
É um direito à opinião
Enquanto o presidente ameaça
Deputados envenenam nosso arroz com feijão

Só que a casa que preocupa é a da tela
De vidro mesmo é nosso telhado
Das paredes ao teto, apedrejado
Com nossa cara na janela

Aí surge a palavra empatia
Apelos e vídeos de arrependimento
Eu não me rendo a essa hipocrisia
De desconstruído e aprendendo

Juro, de boa, que eu até me esforçaria
Se houvesse humanidade aí dentro
Se não causasse ou vibrasse nossa agonia
Não empata, não dá harmonia, 
A fala vazia com o procedimento

Enquanto Choro

Escrevo enquanto choro
Choro enquanto escrevo
A qualquer fé, eu imploro
Amenize essa dor no meu peito
Que não encontra termos, nem meio-termo
Que me faça fugir desse modo
Um modo extremo
Com qualquer água, me afogo

Escrevo em meio ao barulho intenso
Aspirador, avião, teclas, notificações
Uma janela de metal em movimento
A colcha da cama, molhada em porções
Nas tristezas, sempre vem à cabeça, canções
"Mas, a minha lágrima o vento seca"
A lágrima que seca com o vento
A causa, que nem sempre tem claras razões
Só desaguam a dor por dentro

Dor que solta o choro preso
Choro que às vezes nem se entende
Choro que se cobre no leito
Ao travesseiro se prende
A fronha não questiona, compreende
A linha do caderno faz o mesmo
Hoje, eu chorei novamente
E novamente chorando, eu escrevo

terça-feira, fevereiro 01, 2022

Por Moïse Kabangabe

Quanto vale o seu dia?
É exatamente isso que eu ‘tô’ perguntando
Quanto vale seu dia?
É... custa quanto?
 
E seu dissesse que seu expediente vale uma vida?
Eu ouviria: como assim? Que exagero...
Pois, eu vivo no Brasil brasileiro
Onde um congolês fez cobrança devida
A grana de 2 dias de lida
Trampando no Rio de Janeiro
 
A cobrança não foi bem recebida
Ali mesmo fizeram o acerto
Espancaram até a morte um corpo preto
Em covardia mais descabida
Eram 5 na mesma batida
Sem prestações
Racismo aqui não é segredo
Ripa de madeira e bastões
15 minutos de agressões
Mataram sem medo
 
Naturalizou-se a tal ponto
Um imigrante morrer espancado
Ainda por cima, amarrado
Por alguns poucos contos
Que o país, mesmo noticiado
Não está em luto pelo rapaz do Congo
Nem se encontra inflamado
Pronto para o confronto
 
E olha que ironia
Quiosque Tropicália
Nem o movimento referencia
Nem o sentimento de um País Tropical
Abençoado por Deus
Ao contrário, parece que fomos abandonados
Cada um que se vire com os seus
 
Barra da Tijuca, 24 de janeiro
24 também a idade
De Moïse Kabangabe
Rio, do mês que ele morreu
Pra ele não será o Rio de fevereiro e março
Pra essa família, o Rio não continua lindo
Ele continua indo
Como se nada tivesse acontecido
Só que aconteceu, eu não disfarço
Meu verso grita escrito
Mas não faz estardalhaço