quinta-feira, maio 03, 2018

Chamas Sem Ter a Quem Chamar

Um prédio caiu, desmoronou
A imprensa cobriu, noticiou
Houve quem de fato sentiu, lamentou
A queda? Doria atribuiu ao invasor

Porém, na narrativa do fato, ninguém percebeu
Nem estimativa, nem se sabe exato se alguém morreu
A construção falida, um retrato que o escombro escondeu
O resquício de vida jogado aos futuros planos de Deus

Sabe por que não se sabe se morreu alguém?
Porque eles já não eram vivos
Invisíveis e temidos
Lá bem no alto, largados no Largo, no centro de São Paulo
No Paissandu escondidos

Não sabemos se houve mortos
Não há a quem noticiar
Nem familiares a aparecer no lugar
A chorar, pra mídia filmar
Se houver corpos,
o repórter não terá a quem reportar

E diante da tragédia, jornais foram atrás
Do Ministério Público, Defesa Civil e laudos periciais
E entre as informações fundamentais
Um dos repórteres globais
Diz que não havia extintores... capaz...
Ô meu chapa, estava abandonado há 17 anos, queria o que mais?
Elevador funcionando e espirrando essências florais?

Enfim, os já não vivos na visão geral
Viviam malocados na região central
Gente que veio dali, de uma esquina brasileira
Gente que veio de fora, pra escapar da trincheira
E tal qual uma bomba na guerra
Sua base segura é só fumaça e terra

Terra que ruiu, num dia primeiro
Maio, Dia do Trabalhador
Trabalhador, cada vez mais em segundo plano, terceiro...
Escravizado como um favor
Rendido a um líder opressor
De gravata, de farda, de camiseta de qualquer cor

O incêndio por dentro consumiu
A audiência subiu, motivou
Quem sempre e somente proferiu
Palavras de rancor
Fez o que o editor pediu
Lamentou como tragédia: "o prédio caiu"
Mas, logo um culpado, que não seja o Estado, apontou

A mídia fez seu papel
De tirar da reta os seus, de forma sutil
Seu discurso sentido, construiu
A culpa dos culpados, implodiu, omitiu
Culpado é quem invadiu
E ninguém, repito, ninguém vai reclamar
Já que nunca existiu
Sem existir, pra que um lar?
Seu lar é o chão, Seu Brasil.

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